Que me lembre, só por duas vezes assumi publicamente – aqui o publicamente significa, para um universo que ultrapassa as quatro paredes de minha casa, ou uma roda de amigos mais próximos – o meu apoio político declarado a uma pessoa ou causa.
A primeira, não liguem!...
Estávamos em 1974, tinha 14 anos e, numa eleição para a Associação de Estudantes da velhinha (eternamente provisória, apesar de, entretanto ter sido rebaptizada) Escola Técnica de Gago Coutinho - era assim que se chamava –, muito provavelmente na minha primeira demonstração de que não nasci arraçado de carneiro que segue a cabeça do rebanho, fiz parte da lista do MRPP (com o meu caríssimo Jorge Paulino, lembras Jorge? Tenho aqui numa gaveta as folhinhas com as nossas caras e “programa eleitoral”…) porque me atraía muito mais a desorganização, o livre pensamento que cultivávamos, nós, sei lá como era o MRPP, em contraponto à organização e perfeita hierarquização da UEC, a União dos Estudantes Comunistas que dominava completamente no meio estudantil, ainda mais entre os teen-agers. Perdemos, claro.
As eleições.
Mais tarde, já com 18 anos e direito a voto, só falhei, creio, duas eleições.
Uma porque não estava em Alverca, estava fora, ao serviço do Jornal no dia das eleições; outra porque fui surpreendido – culpa minha que não consultei os editais – com a mudança do local onde sempre havia votado.
Como, apesar de ser domingo, para mim era dia de trabalho, e só tinha previsto 5 minutos para ir votar e depois chegar a tempo do comboio para Lisboa, chegado à escola primária a nascente do velho Campo da Bola dei de caras com tudo fechado. E já não tinha tempo para voltar atrás para ir à Filarmónica.
A segunda vez que tomei uma posição pública, tão pública que o meu nome ainda lá está, no site, foi como subscritor da candidatura de Manuel Alegre à presidência da República.
Voltei a perder, mas não me enganei na personalidade do homem que eu gostaria que estivesse hoje no Palácio de Belém.
Por tudo.
Porque foi um resistente à ditadura de Salazar e Caetano, porque sempre foi um Homem de espírito livre, sempre pensou pela sua cabeça e não é uma cabeça qualquer.
Os seus diplomas não foram assinados a um domingo; não fez como o outro que fingiu, até ser descoberto, que não sabia que no seu currículo oficial tinha apenso um título académico que nunca teve.
A sua, de Manuel Alegre, obra, está aí, para quem quiser lê-lo.
Traduzido em dezenas de línguas, poeta maior, dos ainda vivos, da Língua Portuguesa.
Não uns prédiozinhos de emigrante, com marquises a fechar as janelas, como, para se “defender” o outro assumiu ter sido ele o autor do projecto.
O que pouca gente terá acreditado, diga-se em abono da verdade.
Foi a primeira e única vez que votei em alguém na órbita do PS.
E não estou arrependido.
Manuel Alegre, esteve na passada quarta-feira numa reunião/comício promovido pelo Bloco de Esquerda, causando uma brotoeja enorme nos “Boys” do Largo do Rato.
Desde os que já comeram do tacho, dos que ainda agora dele comem, dos que já só lambem os dedos e de muitos que têm como única ambição na vida poder chegar as respectivas barrigas ao mesmo tacho para poderem escolher os melhores pedaços.
“Boys”, muitos deles, que nada mais fizeram na vida do que escalar, degrau a degrau, a escadaria que os pode levar um dia a poderem, pelo menos, passarem o dedo no rebordo do tacho e poderem lambê-lo.
Políticos profissionais.
Infelizmente… a política é deles.
Valem-nos Homens como Manuel Alegre.
«É Tempo de a Esquerda se Unir à Esquerda!», foi uma das suas frases que a CS mais citou.
E Manuel Alegre não estava, tenham a certeza de que não estava, a falar de ocupação de terras ou fábricas, de privatizações mais ou menos tresloucadas.
Manuel Alegre não perdeu o norte, não precisa de bússola para perceber que o seu – também seu – partido socialista já só o é de nome. Aliás, no Parlamento Europeu o PS está incluído na bancada social-democrata!
Manuel Alegre será, nos dias de hoje, a voz menos comprometida e que, por isso, pode clamar por uma maior Justiça Social.
Tenho a certeza de que não será o único Socialista a não se rever no partido do José Pinto de Sousa.
Daí o medo.
Por isso, desde o mais irritante, porque é só isso, caniche, a um par de bulldogs, em relação aos quais será preciso ter algum cuidado, terem saltado em defesa de quem lhes dá, deu, ou eles esperam que um destes dias lhes venha a dar, o ossito, que é disso e para isso que vivem.
Querem mensagem mais clara numa só frase?
«É tempo de a Esquerda se Unir à Esquerda!»
O PS do Pinto de Sousa é tudo menos de esquerda.
É tempo de pôr um travão à cavalgante clivagem Social que vivemos.
Pôr um travão à pornográfica escalada dos ordenados dos gestores, ao mesmo tempo que se pede aos que trabalham que tenham paciência e façam mais um furinho no cinto.
Acabar, redistribuindo-os com os pornográficos lucros da banca, isto quando estes lucros arrastam famílias inteiras, empenhadas até ao último cabelo.
Não sou analista político, mas também não sou parvo – o Mourinho copiou esta minha frase para italiano, o sacana -, ficou o aviso.
E como não acredito que o Pinto de Sousa desista da sua postura salazarenta – que não é o mesmo que salazarista, que isto significaria ser seu seguidor, naquilo que a política do velho “Botas” teve de melhor, que foi na área das finanças – que no PS não se riam da, cada vez mais forte possibilidade da “balcanização” do partido, à imagem do que está a acontecer com o PSD.
E como já não há-de haver muitos “Jobs” para os “Boys”, e ainda há mais votantes com mais de 45 anos do que com menos, percebe-se a brotoeja que pôs todos no Largo do Rato a coçar-se.
É mais do que evidente que já perceberam que numa hipotética cisão, porque quando esta acontecer não vai ser em duas partes mas, tal como está a acontecer com o PSD, em diversas tendências, Manuel Alegre terá a mais larga franja de apoiantes.
Termino com um trecho do poema “Ser ou não ser” de Manuel Alegre (1999).
Já de esperar se desespera. E o tempo foge
e mais do que a esperança leva o puro ardor.
Porque um só tempo é o nosso. E o tempo é hoje.
Ah se não ser é submissão ser é revolta.
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